06 janeiro, 2018

Uma estória de reis





os três mantos do rei

Veio o vento forte, quebrou as portas e as janelas, roubou dos armários as roupas e as tigelas e a chuva a zunir, alagou os tapetes, arrastou as cadeiras, os espelhos estalaram e os peixes vermelhos nadaram nas banheiras e o rei gritou, ai quem me acode num dia assim.

O rei era muito pequenino, mas tinha um coração grande e, tantas eram as vezes, não lhe cabia no peito. Não sei porque sou assim, gritava o reizinho, ai quem me acode e me faz um manto que me esconda do vento, da chuva e do desalento e me deixe o coração de fora para espreitar os pássaros e os peixes vermelhos que nadam nas banheiras.

Faço eu! respondeu o alfaiate. E costurou-lhe um manto de veludo bordado e tal era o peso do veludo e do bordado, que o rei encolheu cinco centímetros e chorou duas lágrimas de sal.

Não, não, sou eu que o farei, disse o joalheiro. E coseu-lhe um manto de jóias brilhantes e tal era o brilho, que o rei deixou de ver durante cinco dias e cinco noites e chorou quatro lágrimas de sal.
A cozinheira também tentou e fez-lhe um manto de claras em castelo, leve como o ar e o reizinho voou e só o agarraram dois dias depois. O rei soluçou de tanto se rir.

Então decidiu fazer ele próprio os seus mantos. Quando a chuva parou e o vento se aquietou, foi ao jardim e escolheu três flores aveludadas, luminosas, leves, singulares e com elas se vestia quando se sentia ensolarado, rodado ou esperançado. O coração grande acompanhava-o sempre, porque agora cabia em qualquer lugar.
A minha foto
 Manuela Baptista

4 comentários:

  1. A história é linda, mas se fosse eu que vestisse o Reizinho, vesti-lo-ia com um manto, feito de folhas de lírio roxo do campo...

    :)

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  2. Novamente de saída, partilho e volto logo à noite para melhor ler o conto.

    Abraço!

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  3. A Manuela tem muito talento para criar e as suas
    histórias de fantasia são encantadoras.
    É pena que não tenha tempo para relacionar-se...
    E... vivam suas majestades, reais ou fictícias.
    Boa semana, Rogério.
    ~~~~~

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  4. ...não lhe dês um peixe, ensina-o a pescar

    grata, Rogério, por este espaço e que seja bom o seu ano ainda novo


    um abraço

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